domingo, 27 de dezembro de 2009

JOAQUIM



A primeira noite em que os remadores no alto mar se alucinaram
e a água se ouviu passar entre as estrelas,
foi revestida de ouro, de fogo e de temor. Então,
o teu nome disse-o o profundo leito do rio : Joaquim.
Na sua cor, no seu mistério, recordando o perdido ofício de peixe,
ele subiu até ao branco mais resplandecente.
Com um sabor áspero e agreste, sobreviveu como ainda hoje
sobrevivem alguns seres humanos.
Os predadores ofereceram-te por ele nacos vivos e coerentes
quando arrastaste os pés e não havia rastos.
Tinhas uma ferida prateada que o vento lambia e os lobos cobiçavam.
A tua imagem desfez-se, passou de adolescente a antecipação e regresso.
Durante quinze, vinte mil anos, possívelmente mais,
ninguém pensou dar o teu nome sequer ao lodo negro.
Depois tornou-se respirável. E começando por
ladrões  e foragidos, veio a ser de profetas e de monges
e, diz-se, chegará a ser nome de pássaro. Quem sabe?
É maleável. Cantável. Doce. Tem as tábuas da paixão,
vem nos antiquissimos livros da vida e da morte.
Mas um nome contente só pode levantar os olhos
quando soar azul dentro de ti.

Joaquim Pessoa,Nomes
Imagem(C)Tsumeb mine

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